3 choques culturais no Brasil

Moro há sete anos em um país exótico, terra do samba, papagaios, tucanos, macacos e beija-flores. A natureza no Brasil é incrivelmente linda, com certeza posso escrever outro artigo sobre isso, mas hoje vou falar sobre a cultura. Quando viajamos para outro país, ou mesmo nos afastamos por um longo período de tempo, temos que lidar com as diferenças culturais.

Definitivamente, existem muitos choques culturais. A cultura brasileira é muito diferente, não só da cultura Tcheca, mas também da cultura europeia. Já morei em vários países europeus, inclusive na Espanha, onde as pessoas têm “sangue quente”, mas nada se compara ao choque cultural no Brasil. Acho que poderia escrever um livro inteiro sobre isso. Não foi nada fácil escolher 3. Escolhi os 3 mais fundamentais com os quais luto até hoje. Definitivamente vou escrever sobre mais em artigos futuros.

  1. “Acho que sim” e “pode ser” que significa NÃO!

Este foi provavelmente o maior choque. Quando vim para o Brasil pela primeira vez em 2011, eu não sabia muito português. Tentei entender graças ao meu conhecimento de espanhol. Imprimi um livro didático de português brasileiro, onde aprendi que a cidade de São Paulo é muito poluída, mas não aprendi o mais básico, quais expressões significam sim e não. No português a expressão “acho que sim” o google traduz como “I think so”, o que para mim significaria 90% sim, e “pode ser” traduzido como “Can be”, o que eu entendo como sim. Levei alguns meses e tomei muitos bolos e frustrações antes de aprender que ambas as expressões significam apenas uma possibilidade, mas provavelmente um NÃO.

O brasileiro não gosta de dizer não, porque não quer ferir os sentimentos do outro. Do meu ponto de vista, não é que eles não querem ferir os sentimentos da outra pessoa, eles simplesmente não querem estar lá. Eles não querem ver outra pessoa triste por causa deles.

Quando tentei descobrir como saberia se posso contar com aquela pessoa, também descobri que sim, significa talvez, tipo 50%. Então, se você me perguntar o que “Sim” significa aqui, depois de 7 anos vivendo neste país eu não consigo te responder. Quando combino com alguém que morou ou esteve na Europa, pergunto se é um sim brasileiro, ou sim verdadeiro. Eles me zoam, riem e depois me dizem que “sim, não se preocupe”, é cerca de 80%.

Minha conclusão é: que não existe 100% sim aqui no Brasil. Ninguém vai te dizer não, então as pessoas te enrolam com um sim, por que não, claro, certamente, pode ser e até sim, sim. E se eles não quiserem, ou se algo ou alguém atrapalhar, eles simplesmente não vêm. Aí quando você pergunta por que eles não vieram, eles vêm com alguma desculpa como, por exemplo, minha mãe ficou doente então eu tive que levá-la para o hospital ou eu tive que trabalhar, então ninguém pode ficar chateado assim.

  1. Classificação imediata das pessoas: “Ele é uma boa pessoa”

Quando um brasileiro começa a falar sobre outra pessoa, seja seu amigo, professor, patrão ou alguém que ele quer recomendar a você para consertar a sua máquina de lavar, uma das primeiras informações que ele lhe conta é: “é uma boa pessoa, gente boa.”

Nós não falamos isso. Se começo a contar a alguém sobre meu amigo Martin, digo, por exemplo, que ele é divertido, que nos conhecemos desde a infância ou que ele é fotógrafo. Eu certamente não vou enfatizar que ele é uma “boa pessoa.” É compreensível, caso contrário ele não seria meu amigo.

Eu não prestei muita atenção a isso no início. Foi só depois de muitas decepções, mentiras e estelionato que entendi o porquê. Há muitas pessoas por aí que simplesmente usarão você em proveito próprio. E o fato de eu ser mulher e estrangeira, e da Europa rica (ninguém faz ideia de quanto é o salário médio na República Tcheca e da diferença econômica em relação à Alemanha), assim a chance alguém tentar tirar vantagem de mim aumenta. Hoje em dia, quando preciso saber o preço, peço ao meu namorado que pergunte.

Os brasileiros desenvolveram o hábito de informar imediatamente a outra pessoa se ela é uma “boa pessoa”. Os serviços aqui no Rio de Janeiro funcionam, principalmente, por indicações. Quando alguém te garante que você pode contar com a outra pessoa, que você não vai pagar e que ela não vai sumir no meio de uma favela e ninguém vai encontrá-la de novo, aí você pode relaxar um pouco.

Mas não pense que estou dizendo que todos os brasileiros pessoas desleais em quem você não pode confiar. Conheci muita gente justa e decente aqui, a quem respeito muito. No entanto, do meu ponto de vista, o fato é que aqui no Brasil é preciso estar atento, até os brasileiros sabem disso, e é por isso que eles imediatamente categorizam uma pessoa. E a primeira informação que você recebe sobre outra pessoa é se ela é ou não uma “boa pessoa”.

  1. Um tipo de relacionamento amoroso sem compromisso

Choque cultural, que só descobri e entendi depois de muito tempo. Há uma espécie de caso de amor aqui sem compromisso, no qual eles denominam “ficar” o que não ocorre em outros países e também nem existe uma palavra para isso. A pessoa com quem você “fica” chama-se “ficante”, que o que Googletradutor nem consegue traduzir para o tcheco. Ficante é alguém com quem você passa o tempo quando tem vontade e sem cobranças. Às vezes um ficante vira namorado ou namorada, para isso acontecer o homem tem que pedir a outra pessoa em namoro”pedir namoro”. Às vezes a mulher também pode pedir o que é menos comum. Às vezes, um dos ficantes pode encontrar uma namorada e assim termina o relacionamento com os outros ficantes. Contudo, às vezes, pode manter alguns como uma válvula de escape.

Eles têm regras especiais aqui para ficantes. Por um lado, ficante não tem as responsabilidades de namorado ou namorada, mas, por outro lado, também não tem os benefícios. Ficante não tem direito a presente de aniversário, natal, dia dos namorados, não tem direito a reunir familiares e amigos, não tem direito a foto conjunta nas redes sociais. Uma pessoa pode ter quantos ficantes quiser, mas geralmente não se fala para um ficante sobre outros ficantes. Ficante não precisa ser só sexo, com ficante você pode ir ao cinema, à praia, passear pela natureza, assistir um filme à noite e se empanturrar de pipoca.

Existe uma blogueira que ganha muito dinheiro dizendo para as mulheres não serem burras, perceberem o seu valor e não ficarem na posição de ficante por meses ou anos. Ela aconselha que 3 meses é o tempo máximo, e se um homem não pedir para ela se tornar sua namorada oficial, então ela não deve ter esperanças de que isso aconteça um dia. Em seus vídeos, ela dá conselhos como não dar presentes ao ficante, não apresentá-lo a amigos ou familiares ou sonhar sobre um futuro juntos. Ela menciona que não existe “ficando sério”, o que significaria um relacionamento aberto sério ou algo assim. Querendo dizer que você tem um ficante exclusivo que não é seu namorado, claro que é um jogo dos brasileiros que querem ter muitos ficantes, mas todos para si.

Para mim, esse negócio de ficante não existe. Eu realmente não entendo como eu poderia me apaixonar por alguém que sai com muitas outras mulheres por aí. A maneira como vejo é que, se encontro alguém de quem gosto e há uma faísca entre nós, decidimos investir tempo para nos conhecermos melhor sem gastar tempo com outros parceiros em potencial.

Quando eu estava no terceiro encontro com o meu atual namorado, eu disse a ele: “Comigo não tem esse negócio de ficante. Eu gosto de você, mas não farei parte de nenhum harém.” Então, ou você desiste do seu harém e vamos nos conhecer e ver até onde vai, ou seremos apenas amigos.” Para um brasileiro, tamanha honestidade deve ter sido bem chocante. Bom, o meu namorado viu isso com bons olhos, pois estava cansado de pessoas que não sabiam o que queriam da vida e ele provavelmente estava feliz que não haveria novela comigo. Depois de uma semana, ele me perguntou oficialmente se eu queria ser sua namorada. Até hoje, ele se lembra com um sorriso e ri falando:””você não vai fazer parte de nenhum harém, hahaha?”

Se você decidir começar um relacionamento com um homem ou uma mulher brasileira, certifique-se de que você não é apenas um dos muitos “ficantes”.  Acho que vou deixar isso para você decidir.

 

Eu poderia escrever por horas e horas sobre as diferenças culturais aqui no Brasil. Algumas dessas diferenças culturais me irritam, por causa da minha personalidade. Algumas diferenças culturais eu já me acostumei e outras eu adotei como minhas (como chegar atrasado, você aprende rápido quando está sempre esperando alguém em algum lugar, haha). Não temos que adotar os costumes de outra cultura, por exemplo, nunca me permiti ser um “ficante” porque simplesmente não me agrada. No entanto, devemos estar cientes sobre os costumes culturais, para não nos tornarmos vítimas deles. Este artigo é o meu primeiro sobre a cultura brasileira e certamente não será o último, então você definitivamente deve esperar por mais artigos engraçados  e interessantes sobre o assunto.